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Outros Cadernos de Saramago

Outros Cadernos de Saramago

15 Jun, 2010

Responsabilidade

As misérias do mundo estão aí, e só há dois modos de reagir diante delas: ou entender que não se tem a culpa e, portanto, encolher os ombros e dizer que não está nas suas mãos remediá-lo — e isto é certo —, ou, melhor, assumir que, ainda quando não está nas nossas mãos resolvê-lo, devemos comportar-nos como se assim fosse.La Jornada, México, 3 de Dezembro de 1998
14 Jun, 2010

Catorze de Junho

Cerremos esta porta.Devagar, devagar, as roupas caiamComo de si mesmos se despiam deuses,E nós o somos, por tão humanos sermos.É quanto nos foi dado: nada.Não digamos palavras, suspiremos apenasPorque o tempo nos olha.Alguém terá criado antes de ti o sol,E a lua, e o cometa, o negro espaço,As estrelas infinitas.Se juntos, que faremos? O mundo seja,Como um barco no mar, ou pão na mesa,Ou rumoroso leito.Não se afastou o tempo. Assiste e quer.É já pergunta o seu olhar agudoÀ primeira palavra que dizemos:Tudo.In Poesía completa, Alfaguara, pp. 636-637
11 Jun, 2010

Cada vez mais sós

Acho que todos nós devemos repensar o que andamos aqui a fazer. Bom é que nos divirtamos, que vamos à praia, à festa, ao futebol, esta vida são dois dias, quem vier atrás que feche a porta – mas se não nos decidirmos a olhar o mundo gravemente, com olhos severos e avaliadores, o mais certo é termos apenas um dia para viver, o mais certo é deixarmos a porta aberta para um vazio infinito de morte, escuridão e malogro."Cada vez mais sós", in Deste Mundo e do Outro, Ed. Caminho, 7.ª ed., p. 216(Selecção de Diego Mesa)

Nós estamos a assistir ao que chamaria de morte do cidadão e, no seu lugar, o que temos, e cada vez mais, é o cliente. Agora já ninguém te pergunta o que pensas, agora perguntam-te que marca de carro, de roupa, de gravata tens, quanto ganhas...El Mundo, Madrid, 6 de Dezembro de 1998
09 Jun, 2010

Livros

Começar a ler foi para mim como entrar num bosque pela primeira vez e encontrar-me, de repente, com todas as árvores, todas as flores, todos os pássaros. Quando fazes isso, o que te deslumbra é o conjunto. Não dizes: gosto desta árvore mais que das outras. Não, cada livro em que entrava, tomava-o como algo único.El País Semanal, Madrid, 29 de Novembro de 1998

O viajante está feliz. Nunca na vida teve tão pouca pressa. Senta-se na beira de um destes túmulos, afaga com as pontas dos dedos a superfície da água, tão fria e tão viva, e, por um momento, acredita que vai decifrar todos os segredos do mundo. É uma ilusão que o assalta de longe em longe, não lho levem a mal.In Viagem a Portugal, Ed. Caminho, 21.ª ed., p. 137(Selecção de Diego Mesa)
04 Jun, 2010

Momentos

Há momentos assim na vida: descobre-se inesperadamente que a perfeição existe, que é também ela uma pequena esfera que viaja no tempo, vazia, transparente, luminosa, e que às vezes (raras vezes) vem na nossa direcção, rodeia-nos por breves instantes e continua para outras paragens e outras gentes.In Manual de Pintura e Caligrafia, Ed. Caminho, 6.ª ed., p. 291(Selecção de Diego Mesa)
03 Jun, 2010

Educar para a paz

Resulta muito mais fácil educar os povos para a guerra do que para a paz. Para educar no espírito bélico basta apelar aos mais baixos instintos. Educar para a paz implica ensinar a reconhecer o outro, a escutar os seus argumentos, a entender as suas limitações, a negociar com ele, a chegar a acordos. Essa dificuldade explica que os pacifistas nunca contem com a força suficiente para ganhar... as guerras."Israel vive às custas do Holocausto", em Palestina existe!, Madrid, Foca, 2002 [Prólogo e edição de Javier Ortiz] [Entrevista de Javier Ortiz]