Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Outros Cadernos de Saramago

Outros Cadernos de Saramago

23 Jun, 2009

Sastre

Conheci o dramaturgo Alfonso Sastre há mais de trinta anos. Foi o nosso único encontro. Nunca lhe escrevi, nunca recebi uma carta sua. Fiquei com a impressão de um carácter áspero, duro, nada complacente, que não facilitou o diálogo, ainda que não o tivesse dificultado. Não voltei a saber dele, salvo por ocasionais e pouco expressivas notícias de imprensa, sempre relacionadas com a sua militância política nas fileiras abertzales. Nas últimas semanas, o nome de Alfonso Sastre voltou a aparecer como candidato cabeça-de-lista às eleições europeias, integrado numa Iniciativa Internacionalista de recente formação. A agrupação não obteve representação no parlamento de Estrasburgo.Há poucos dias a ETA assassinou o polícia Eduardo Puelles pelo quase sempre infalível processo da bomba-lapa colocada na parte inferior dos carros. A morte foi horrível, o incêndio carbonizou o corpo do infeliz, a quem não houve maneira de acudir. Este crime suscitou em toda a Espanha um movimento geral de indignação. Geral, não. Alfonso Sastre acaba de publicar no jornal basco Gara um artigo ameaçador em que fala de “tempos de muita dor em lugar de paz”, ao mesmo tempo que justifica os atentados como parte de um “conflito político”, acrescentando que mais atentados haverá se não for aberta uma negociação política com a ETA. Quase não acredito no que leio. Não foi Sastre quem fixou a bomba no carro de Eduardo Puelles, mas o que eu não esperava era vê-lo como valedor de assassinos.